ARTIGO | DESAFIOS DAS STARTUPS EM VENTURE CAPITAL E PRIVATE EQUITY
10/02/2022
Os anos recentes têm sido memoráveis para o universo das startups no Brasil e confirmam que o capital investido está sendo direcionado, em grande medida, para projetos ainda em fase de consolidação, mas que demonstrem elevado potencial de crescimento. Alguns entraves e peculiaridades do contexto brasileiro, contudo, indicam que setor tem avançado aquém de suas potencialidades.
Recente estudo da Associação Brasileira de Private Equity e Venture Capital no Brasil (Abvcap) revelou que, apesar das restrições de convívio social impostos pela pandemia da covid-19, o ano de 2020 foi marcado por recordes históricos de investimento na indústria de Private Equity: R$ 24,4 bilhões de reais foram investidos em 259 empresas – um crescimento de quase 80% contra 2018.
Os investimentos de Venture Capital (VC) relacionam-se a aportes em empresas de pequeno ou médio porte, sobretudo startups que estão em fase de consolidação de seus negócios. Por outro lado, os investimentos de Private Equity (PE) relacionam-se a aportes de capital em companhias que não tem o capital aberto e geralmente dão-se por meio de fundos de investimento em participações, modalidade regrada pela CVM. Nesse caso tem-se negócios mais consolidados no mercado que provavelmente em curto espaço de tempo abrirão seu capital em bolsa.
O estudo revelou que R$ 14,8 bilhões de reais foram investidos em 2020 por VC contra R$ 9,8 bilhões em PE. A leitura que se faz é: os investidores, no Brasil, apostam em negócios ainda em fase de consolidação e, majoritariamente, em startups.
Os números, contudo, ainda se mostram tímidos perto da fatia do PIB brasileiro. Enquanto em 2020 os investimentos representaram somente 0,35% do PIB Brasileiro, nos EUA os investimentos de Venture Capital e Private Equity chegaram a 1,60%.
E é sobre as causas pelas quais o setor ainda não avançou o que poderia, que devem centrar-se as atenções.
Do ponto de vista regulatório, o emaranhado de agências reguladoras, a legislação complexa e pouco clara, com má técnica legislativa, e o conjunto rebuscado de regras regulatórias impedem que os negócios no Brasil se desenvolvam com um nível razoável (e não exagerado) de interferência estatal que não engessem excessivamente novos negócios.
São louváveis iniciativas recentes como os sandboxes regulatórios realizados pela Susep, pela CVM, pelo Banco Central (BC) e por outras agências, que permitem que novos negócios sejam testados com menor interferência estatal, em um ambiente controlado e sem comprometer a segurança do usuário final.
Os empreendedores, por sua vez, também precisam fazer um mea culpa. Do ponto de vista de governança corporativa percebe-se que pequenos negócios não têm incentivo para que se organizem internamente em termos contábil, jurídico e fiscal e estejam prontos a receber investimentos de grupos multinacionais, organizados corporativamente e altamente preocupados com a sofisticação dos processos internos das companhias. Quanto mais processos internos, menor o risco, maior o investimento.
Não é raro no Brasil notar que o empreendedor se preocupa majoritariamente com a sua ideia, com o seu produto final, dedicando, entretanto, pouca energia e investimento para organizar a casa antes de procurar investidores. A segurança jurídica é fator-chave para garantir a atratividade no negócio. A consequência do baixo grau de governança é a desvalorização do negócio com um valuation impactado negativamente pelo baixo grau de organização corporativa.
No retrovisor, a imagem é otimista: o volume de investimentos cresceu, os sandboxes regulatórios são uma esperança e a legislação aperfeiçoou-se. Vide, por exemplo, a promulgação da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), o Marco Legal das Startups e o Marco Civil da Internet. No horizonte, a imagem é de um terreno fértil de oportunidades que precisa ser regado pelo Estado.
São imprescindíveis reformas profundas na estrutura do Estado Brasileiro – sobretudo pela tributária – para que o Brasil seja definitivamente o paraíso das startups e a população se beneficie com um alto grau de inovação tecnológica e sofisticação dos serviços típicos dos agentes inovadores. A chegada do 5G deve ser o estopim para que o Estado acolha, exemplarmente, ideias inovadoras na velocidade que a vida moderna requer.
*João Quinelato é sócio de direito digital do Chalfin, Goldberg e Vainboim (CGV) Advogados e professor de direito digital no IBMEC.
As opiniões neste espaço refletem a visão dos especialistas e executivos de mercado, e não a do Finsiders.