SIGILO DE DADOS DE CLIENTES DE BANCO

26/04/2023

Até que ponto um empregado, que tem seu contrato de trabalho com um banco extinto, pode fazer uso de informações adquiridas enquanto vigorava o pacto laboral ? Ainda que seja largamente entendido tratar-se violação ao direito concorrencial, uma vez que a listagem de clientes fidelizados após alguns anos de trabalho constitui valor agregado ao negócio da instituição financeira, a justiça ainda se depara com questionamentos  quanto à utilização de dados sigilosos que integram os registros do banco por antigos colaboradores.

 

Recentemente, a Justiça do Trabalho concedeu tutela de urgência em ação ajuizada por banco prejudicado, determinando que seus ex-empregados, ativos em instituição financeira concorrente, se abstenham de utilizar a lista de seus clientes e abordá-los. A decisão considerou que as abordagens realizadas a clientes do banco por seus ex-empregados decorrem da utilização de dados sigilosos que integram os registros do banco. Tais informações decorrem dos vínculos empregatícios mantidos e são necessárias ao desempenho das suas atividades.

Vale destacar que os dados em geral e, com mais propriedade, os dados sensíveis e pessoais, tais como endereço de e-mail e telefone, pertencentes aos clientes de um banco são destinados para uso exclusivo daquela instituição, não sendo legítimo que os empregados, após rompido o vínculo de emprego, façam uso de tais informações para qualquer fim.

Ressalte-se que os empregados de instituições financeiras, especialmente os que detêm maior fidúcia, têm como matéria prima do seu trabalho dados intrinsecamente ligados à intimidade e privacidade dos clientes. Considerando que a privacidade, inclusive na sua vertente do sigilo bancário, é protegida por norma constitucional, o poder de acesso a tais dados traz, como contrapartida, o pleno dever de sigilo e confidencialidade sobre essas informações.

 

O cidadão ao decidir abrir uma conta, aplicar valores, realizar depósitos e pagamentos estabelece com a instituição financeira relação de extrema confiança, especialmente quando lhe outorga a administração de parte do seu patrimônio. Há uma abertura de dados sensíveis, inerentes à intimidade e privacidade da pessoa com o banco escolhido.

Em resposta à tamanha confiança e abertura de dados é que surge o dever inviolável de sigilo. O sigilo bancário é a obrigação imposta aos bancos e a seus empregados e prepostos de que não restem revelados, sem autorização judicial, os dados pertinentes a seus clientes, que, como consequência das relações jurídicas que os vinculam, sejam de seu conhecimento. Integra, assim, com o direito à privacidade e intimidade, previstos no artigo 5º, X, da CR/88.

Não é por outro motivo que as instituições bancárias sofrem forte regulamentação e fiscalização. Assim, a quebra do sigilo confiado ao Banco, sem justificativa legal, fere o direito à intimidade e a própria dignidade da pessoa humana, valor maior da nossa Constituição, gerando — inclusive — direito a ressarcimento por dano moral.

Por sua vez, o artigo 154 do Código Penal prevê que é crime revelar informação da qual tenha dever de sigilo em razão da função.

Ao restar extinto o contrato de trabalho, é certo que se o agora ex-empregado porta cópia de dados dos clientes do Banco, o faz de forma ilícita, passando a violar o sigilo bancário de todos os clientes cujas informações detém.

Argumente-se que o inciso I do artigo 5º da Lei 13.709/2018 (LGPD) aponta de forma expressa que dados pessoais são as informações relacionadas à pessoal natural identificada ou identificável — como por exemplo nome, telefone, CPF, data de nascimento, endereço residencial, endereço de e-mail, endereço de seu perfil em redes sociais ou quaisquer outros dados relacionados à pessoa — e, seu tratamento, nos termos do artigo 7º da mencionada lei, somente poderá ocorrer mediante consentimento do titular.

Cumpre aqui lembrar, ainda, que a responsabilidade pós-contratual é de imperiosa aplicação no ordenamento jurídico, inclusive na seara trabalhista.

A responsabilidade pós-contratual é acarretada pela subsistência de deveres colaterais entre as partes mesmo após o fim do contrato, em virtude do princípio da boa-fé objetiva, que impõe um comportamento ético e probo para ambas as partes.

Restou pontuado pelo Juiz do Trabalho prolator da decisão ora em comento que as “condutas implicam na inobservância do dever, inclusive em âmbito pós contratual, de manutenção do sigilo das informações confidenciais de que tinham acesso os ex-empregados quando da vigência dos liames empregatícios”.

E, em determinadas situações, esse dever é contratual, pactuado no próprio contrato de trabalho com projeção futura ou em termos rescisórios que contém pactos de confidencialidade.

Assim, não se pode mais ter dúvidas de que dados pessoais — nome, e-mail e telefone — e dados bancários de clientes de um Banco não podem ser utilizados, sem o consentimento desses — de forma alguma — por ex-empregados da instituição financeira, após o rompimento do vínculo empregatício. Do contrário estar-se-ia diante de flagrante violação do direito à intimidade e da garantia de inviolabilidade da comunicação, protegidos constitucionalmente nos artigos 5º, X e XII, da Carta Magna.

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